Há mais coisas na fila do cinema do que julga nossa nem sempre vã filosofia.
As duas moças encostam no balcão. Uma delas pergunta ao bilheteiro:
– Hoje tem a promoção do beijo?
Aquela, onde casais que se beijam na bilheteria pagam meia. Tem que ser beijo pra valer, de cinema. Selinho não vale, que ali não é Correio. É a hora do amor premiado: bom para beijoqueiros, bom para quem quer economizar. Bom para o dono do lugar, que fica lotado.
Sim, hoje tem promoção. A outra moça pergunta, baixinho e exatamente com os intervalos das reticências a seguir:
– E… precisa ser… homem e mulher…?
Receiam que a promoção não seja válida para elas. Talvez, uma condição prevista no regulamento, escrita em letras microscópicas, derivada de algum asterisco preconceituoso. Carecia confirmar.
O bilheteiro, pela primeira vez e por dois segundos, as encara e sorri:
– Não. Não precisa.
Quando eu era criança, na sala de aula, morria de vergonha de perguntar as coisas que eu não sabia ou não entendia. Invejava os colegas que levantavam a mão e expunham suas dúvidas – cabidas e descabidas – sem ficar com o coração palpitando, bochechas em fogo. Minha mãe ensinava que não se devia trazer dúvida para casa. Como se dúvida fosse algo que se levasse para passear. Então, havia a que ia de casa para a escola. E tinha a dúvida que vivia nas ruas, como a das moças na bilheteria.
Regra esclarecida. As duas, num riso particular, só delas, se beijam. Beijo de dois segundos. Para combinar com o tempo do bilheteiro ou a pressa da vida – que não é tão moderna. Poupam, assim, metade do valor do ingresso. É justo; investiram o dobro da coragem que tantos, ao longo da fila, não ousariam. Economia, quem diria, não é só número.
Em meio à gigantesca e nem sempre afável sala de aula urbana, elas resolveram erguer a mão e sanar a dúvida. Arriscaram publicar sua cabida questão. Que não é pequena, tal a alma de quem ama.
O filme há de valer a pena.
Aqui a pessoa que tem essa coragem, geralmente, é chamada de utilidade pública. Hahahaha
Adorei a crônica, Sil.
Beijos!
Camila
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Belíssimo! A vida vale a pena ser vivida e exibida sem vergonha de sermos quem somos.
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rs rs rs…
Isso me lembrou uma situação parecida numa das filas de cinema em SJC… Onde as moças fizeram a pergunta num outro dia qq e prometeram voltar no dia que valia.
Nunca conseguiram. Mas sempre tiveram muito mais do que coragem: atitude pra assumir um amor.
Pena que algumas coisas se efetivam apenas na projeção que fazemos delas.
Enfim… Valeu o filme. Valeu a vida e vale sempre qq forma de enfrentamento pelas coisas que julgamos sagradas!!!!
Pontinha de inveja das moças, confesso!
Bjs q pintou nostalgia aqui…
Si
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Cheguei na graduação ainda com medo desse momento de perguntar e confesso que levei tempo prá ter coragem, essa coragem que você tão bem explanou. Bjssss
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