A inteligência da escada rolante

foto: Simone Huck

Gosto de observar escada rolante. Mas não qualquer uma. Só as inteligentes.

Funciona assim: quando não tem ninguém usando, a escada rolante se move vagarosamente. Para economizar energia. Basta alguém botar o pé nela, no entanto, para que ela role mais rápido. Quando a pessoa sai, não havendo mais ninguém sobre ela, a velocidade diminui novamente. E assim ela passa o dia. Movimentando-se mais rápido quando é necessário; poupando energia no resto do tempo.

Eu quero ser como a escada rolante inteligente.

Porque ela é esperta e sabe identificar a hora de agir. Nem antes, nem depois; no momento exato.

Eu não.

Passo os dias rolando velozmente sobre minha própria engrenagem, vivendo e revivendo coisas vividas e ainda nem vividas.

Gasto energia à toa, não me poupo.

Sempre acelerada, executo tarefas e penso pensamentos sem parar, nem mesmo desacelerar. Emendo fazeres uns nos outros, sequencialmente, tais os degraus da escada rolante.

Na esteira non-stop da imaginação entabulo diálogos mentais inteiros, antecipo conversas. E quando a conversa acontece, bingo. Não sai do jeito que imaginei. A pessoa não fala o que eu ensaiei para ela dizer, audácia da pilombeta! Perdi tempo e desperdicei energia tendo a pré-conversa imaginária. Fosse eu como a escada rolante inteligente, só me ateria à prosa na hora da prosa.

Com e sem estímulo, subo e desço, desço e subo. Às vezes, também rolo em elipses e não chego a lugar algum.

Sou um modelo obsoleto de escada rolante. E o cansaço manda a fatura no fim do dia, do mês, do ano. Não quero mais pagar. Nem rolar em vão.

Por isso gosto de observar a escada rolante inteligente. Há em seu movimento hipnótico uma inegável sabedoria. Que só consigo captar quando estou quietinha. Como agora.

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