A saia justa das mães

Todo ano, a história se repete. Nos dias que antecedem o segundo domingo de maio costumo ouvir, onde quer que eu vá, votos de feliz dia das mães. Justificáveis, já que em boa parte do tempo estou com minha cria a tiracolo. Sempre agradeço. E, no caso da autora ser uma mulher desconhecida, mas com perfil compatível com a maternidade, fico desnorteada: retribuo os votos ou não?

Impossível saber se uma mulher é mãe, quando sua prole não está presente e não há nenhuma informação que leve a essa conclusão. Mães costumam ter cara de mãe, mas esse é um parâmetro subjetivo demais. O impasse da retribuição, então, está instalado. Se se trata de uma mulher que é mãe e tem filho, alívio. A cena é padrão, os votos são bem-vindos. Mas e se ela já teve um filho e, adversidades da vida, não o tem mais? Quando ela não é mãe, o voto fica vazio, e se desfaz no ar antes mesmo de entrar pelos seus ouvidos. Pode acontecer de ela ser uma mulher que acalenta, há anos e sem sucesso, o sonho de ser mãe. Como também pode ser que a maternidade jamais tenha lhe passado pela cabeça.

Diante de tantas possibilidades, sem condições de serem aferidas durante uma conversa informal e brevíssima – por exemplo, com a caixa do supermercado, a garçonete do restaurante, ou ainda, a moça do café, que só sabe de você das nove às seis –, o que fazer? Não é sempre que se tem vontade de engatar um papo para saber das coisas.

Costumo lançar mão do lacônico “Obrigada…”. Embora as reticências, normalmente três inofensivos pontinhos, se transformem nessa hora em enormes, terríveis e pesadas esferas de ferro, verdadeiras rochas entravando o que poderia ser apenas mais um diálogo banal. Aí, o jeito é sair de fininho. Assobiando, se possível.

Quando quero ser amável, faço uma avaliação instantânea para intuir se a mulher já pariu na vida e arrisco um “Para você também!”. Em seguida, fico no aguardo, como um condenado à espera do pelotão de fuzilamento, do meu aniquilamento perante uma possível e bombástica revelação: “Não tenho filhos”. Claro que o motivo é uma das alternativas já mencionadas. Ou outras, eventualmente mais delicadas. Nessa hora, recorro ao silêncio. Para não perpetuar o famoso ditado sobre sonetos e emendas. No máximo, ameaço um “Aaah”, apanho o celular na bolsa e finjo que atendo uma ligação. Ninguém vai saber que é mentira. Essa é, de longe, a maior utilidade do modo vibrar desses aparelhos.

A saia justa parece não se restringir apenas ao dia das mães. Homens também devem passar seus apertos em vésperas de dia dos pais. Apesar de que, em situações assim, eles se limitam a agradecer, tenham filhos ou não. Sem dramas. Homem é tão mais simples. Em relação ao dia dos namorados, já é de praxe ninguém se manifestar. Para não ser obrigado a assistir ao chororô.

Há coisa pior, porém. Muito pior. Capaz de reduzir a nada qualquer apuro de dia das mães. Experimente perguntar a uma mulher para quando é o bebê, sendo que ela não está grávida. Com o poder de destruição de um míssil Moskit, um disparo desse arruína um dia, até então, bom. Traz à tona discussões sobre a pena de morte, com louvações à guilhotina. Cria na vítima um arrependimento irreversível acerca do sundae de chocolate duplo do dia anterior. Lembra-a do plano semestral quitado de uma vez só na academia, jamais utilizado.

Aí não é gafe. É incitação ao suicídio. Toda serenidade nessa hora.

7 comentários em “A saia justa das mães

  1. Tempos modernos, esses, não?
    Pior, é perguntar a um homem mais velho, acompanhado de uma mulher, bem mais nova: “é sua filha”?!
    Dessa, já aprendi a me desviar. Aprendi. Agora, pergunto: “que parentesco vocês têm?”
    Mas o melhor, é ser confundida como irmã do filho mais velho. Aí, essa mãe aqui fica “toda prosa”…rsrs

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  2. Adorei seu texto. Vim ler seu blog seguindo a dica da minha amiga Tânia.
    Eu nem costumo falar sobre datas desse tipo com ninguem, nem perguntar nada, nem desejar nada. Fico na minha, até pq não sou mãe, não pretendo ser. Se alguem me deseja feliz dia das mães,ok, fico feliz, pq pelo menos tenho minha mãe viva comigo e muito bem de saúde, por muitos anos, se deus quiser. E retribuo.
    Tem esse pequeno detalhe, tem gente que pode querer passar longe de dias das mães esse ano, por ter perdido a mãe no ano passado, ou um filho, etc. Se realmente não sei como será o dia das mães de alguma conhecida minha, não questiono sobre isso mesmo! e nem faço votos, se ela teve um fds feliz ela me conta, se quiser, não é??
    Dia dos pais, idem. Dia dos namorados, bem, se estou sozinha ou sem nada em vista simplesmente respondo que ainda não resolvi o que vou fazer… funciona, deixa a pessoa que perguntou na mesma… rsrsrsr… e não toco mesmo nesse assunto nem com as amigas que estão namorando( vai saber como anda o namoro dela)… melhor ficar calada mesmo.
    Feliz dia das mães e dos pais, só digo para os meus pais. E feliz dia dos namorados, só digo para a pessoa que estiver ao meu lado nessa data( se houver alguem)… rsrsrsr beijos!!

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  3. Sil querida,
    literalmente as saias mais justas que podemos passar na vida. Também me abstenho de desejar ou retribuir porque passo pelos mesmos receios que você. Difícil né? Até porque ser mãe, a meu ver nada tem haver com gestação. Tenho uma Tia Avó que é mãe e morreu virgem. Amou e criou como seus os filhos de muitos, inclusive uma parte de minha educação devo à sabedoria dela.
    Ou seja, FELIZ DIA DAS MÃES À TODAS MAS MULHERES QUE AMAM INCONDICIONALMENTE SEUS FILHOS, SEJAM ELES BIOLÓGICOS OU NÃO.
    Ah, nesse caso os filhos podem ser primos, irmãos mais novos, sobrinhos, vizinhos, parentes e afins!

    Beijos na alma!
    Layla Barlavento
    culpadowalter.blogspot.com

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  4. Sil, que saia justa das mães, hein?

    Entre nós homens a coisa é mais simples mesmo!
    No máximo, uma gargalhada e um tapa na cabeça seguido de um: “tá louco? tenho filhos não, cara!”

    Mas assumo que é bem mais light!

    Abraço mineiro!

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  5. Oi Silmara

    Não tive muito acesso a internet nos ultimos meses, mas agora to de volta..risos!! E claro entrei pra elr tudooo aqui, e como sempre fica um misto de emoção, riso, alegria…
    Beijão

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  6. Oi Silmara,

    esse post foi ótimo, só lembrei das gafes que já cometi kkkkk
    Bem, também fico nessa “saia justa” na hora de dizer “obrigada” ou “prá você também”, primeiro porque não sou mãe, segundo porque a gente não faz idéia de quem já é.
    Adorei tua análise, porque vivo nessa saia justa todo ano kkkk

    bjs

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  7. Querida Silmara!!
    Você tem um humor incrível!! rsrs
    Passei por essa situação ontem mesmo. Depois do café da manhã com a mamy em uma padaria muito gostosa, me pego dizendo “igualmente” para caixa e fico com cara de dúvida depois de ter dito isso(ahahaha). Saí super rápido e tudo bem!

    bjsss e boa semana!!
    FELIZ DIA DAS MÃES (atrasado)!!

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