Blue jeans

Gagarin já havia cantado a bola: a Terra é azul.

Talvez não tenha sido o primeiro jeans que vesti. Mas digamos que meu début no indigo blue tenha sido com uma US Top. “Não usa quem não quer”. E eu queria aquela calça que desbotava e perdia o vinco. Ganhei uma e ficava dividida entre querê-la em seu intacto denim, postergando ao máximo colocá-la no cesto de roupa para lavar, ou vê-la clarear como prometia a propaganda na TV.

Da US Top, migrei para a Lee. Quase uma deidade têxtil, espécie de metonímia para jeans, “calçali”. Quem não usava era boko-moco. Será que fui de Lee ou US Top assistir a King Kong no cinema?

Sob influência dos irmãos, mais velhos e descolados, cheguei à Levi’s. “Levi’s é no Centro, na Jeans, Jeans Tarka”. Santo pedacinho de couro marrom grudado no cós. Levei anos para sacar os dois cavalinhos puxando a calça, cada um para um lado. “Quality clothing”, eu repetia com inglês treinado nas letras dos Beatles. Usava uma quando fui ao Teatro Municipal e me apaixonei por um garoto desconhecido do outro lado do foyer. Eu não tinha nem dez anos.

Entrei no ginásio e as pessoas eram – ao menos na Mooca – classificadas em três tipos. Os que usavam Soft Machine, os que se viravam com as imitações e os que não tinham nem uma, nem outra (meu caso), e se dedicavam a fiscalizar a bunda alheia para identificar quem fazia parte do primeiro e do segundo tipo.

Então, surgiu na TV a propaganda de um homem lindo, só de calça jeans, numa praia idílica, brincando com um cachorro lindo; os dois correm ao encontro de uma moça linda, com uma música linda embalando tudo. O amor é azulzim. Eu tinha que ter um jeans Staroup, poxa! Foi minha primeira “calça com lycra” ou, tecnicamente, com elastano. Mais justa que Deus.

Passei pelos Wrangler e tornei-me, enfim, adepta dos Ellus. Adulta e inserida na sociedade de consumo, entrei na loja e pá!, assinei com gosto o checão do Banespa, deixando ali meu primeiro salário de estagiária in-tei-ri-nho. A insana aquisição foi, além de falta de educação financeira, recall tardio de uma propaganda que nem passava mais. Como esquecer daquele comercial com o casal tirando a roupa dentro da piscina, “Meu bem, você me dá água na boca”?

De lá para cá tanto mudou. As propagandas. Eu. Azulejaram minha vida jeans de múltiplas personalidades. Apertados e largões. Rasgados e certinhos. Barra dobrada, desfiada, com durex. Boca de sino, baggy, skinny, saruel. Delavê, stone washed. Cintura alta, cintura baixa, clochard (aargh). A moda passa; jeans não se passa.

Costurei essa história toda para dizer que comprei um jeans sem pedigree no Carrefour, por quarenta e nove contos, e estou absolutamente satisfeita.

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