Redação: Minhas férias

Arte: Mariana Valente
Arte: Mariana Valente

férias. [Do lat. ferias.] S. f. pl. 1. Dias em que se suspendem os trabalhos oficiais (datas patrióticas e dias santificados); feriado. 2. Certo número de dias consecutivos destinados ao descanso de funcionários, empregados, estudantes etc., após um período anual ou semestral de trabalho ou atividades. [Cf. ferias, dos v. feriar e ferir.]

Viu? O verbete não fala nada, nadica, sobre as mães. Mães, portanto, não pertencem à categoria de gente com direito a férias. Eventualmente, talvez estejam incluídas no “etc.”. Mães não tiram férias nunca, nunquinha. Mesmo quando tiram. Não está na constituição, mas no dicionário.

O substantivo “férias” é comumente ligado a um pronome possessivo que, depois que se tem filhos, é usado em todas as pessoas, exceto na primeira do singular. As férias passam a ser dos outros ou deles. Predominantemente deles, os filhos. Ponto final.

Quando eu era criança, toda volta às aulas, em começo de ano ou primeira semana de agosto, vinha com o previsível e aborrecido tema para a redação: “Minhas férias”. Eu ficava entediada, porque nem sempre tinha coisas estupendas para contar. Raramente viajava. Brincava na rua, ficava acordada até mais tarde e escrevia no meu diário. Poderia, aliás, tirar uma cópia dele e apresentar à professora, todos os anos. Pouparia-me um trabalhão.

Se hoje eu tivesse de fazer uma redação assim, ninguém ia querer lê-la, ou eu tiraria zero, já que a deste mês começaria assim:

No primeiro dia das férias (deles) eu estava tomando banho tranquilamente, quando a caçula emitiu SOS lá da sala por ocasião de ter pisado, descalça, no cocô que a gata – adoentada e levemente incontinente – fizera no tapete.

Nos últimos trinta dias, eu não fui gente; fui uma espécie de entidade, cujas atividades consistiram em assistir Carrossel, passar filtro solar nas crianças e apartar brigas. Minhas frases se resumiram a “Larga esse iPad” e “Não faz isso com seu irmão”, com a variante “Não faz isso com sua irmã”. O episódio do cocô, felizmente, foi pontual.

Julho ainda não acabou, mas as férias, sim. As aulas recomeçaram ontem. Não se usa mais passar o antiquado tema para a redação. O assunto, no caso deles, fica para conversas informais com os professores e amigos. No meu caso, com o terapeuta.

Dezembro é logo ali, virando a esquina.

3 comentários em “Redação: Minhas férias

  1. Silmara, gostei do ar de praia entediada da sua crônica! rsrsrs
    As suas férias não foram assim ‘tipo’ Brastemp, mas como vc já começou ilustrando com o Totoro (que adoro!), talvez tenha por aí uma graça e magia escondidas, confessa, vai?
    Desta vez, sua redação teve outra paisagem (com um pouco de areia e sol) e ralhar com os filhos nesse ambiente pode até ter um gostinho de camarão no espeto. Pra quem gosta, é prato cheio!
    beijo de volta.

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  2. Sabe Sil….ontem meu marido disse q preciso voltar a tomar remedios, pq estou estressada. Disse q ele nao aguenta o tranco sem gritar por um fds, como pode me exigir calma e paciencia por trinta infinitos e longos dias, que na verdade sao 31? Estamos juntas!

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