Foto: Anthony Kelly/Flickr.com
Cena 1. Terceira vez que eu via a moça naquele café. Na primeira, só pensei em falar. Na segunda, deu vontade de falar. Mas ela se levantou da mesa e foi embora. Na terceira, pensei, deu vontade e ela olhou em minha direção. Soltei:
– Seu cabelo é muito bonito.
A moça fingiu que não entendeu e murmurou o Ãn? mais blasé do mundo. Elogiar desconhecido é quase sempre arriscado, a gente nunca sabe o que vem no rebote. E quando o elogiado faz que não escutou, repetir o elogio torna tudo sem graça. Desejei ter ficado de bico calado, mas tive que dizer de novo. Aquilo de ajoelhar e rezar. Ela, então, passou a mão nos ditos cujos e lançou-me um olhar de incompreensão:
– Está tão sujo…
Cena 2. Festa na casa de amigos, reparei na roupa de uma convidada. Como a dona do traje era amiga, espécie de comadre, me senti à vontade:
– Gostei do seu vestido!
A amiga não posou de blasé e entendeu de primeira. Mas retrucou, com a mesma incompreensão da moça do café:
– É tão velho…
Cena 3. Reunião de trabalho. Meu radar, treinadíssimo, captou um maravilhoso par de sapatos sob a mesa. Quem os calçava não era uma desconhecida, tampouco alguém muito íntimo. Aguardei a brecha:
– Amei seu sapato.
A mulher, diferentemente das outras duas, sorriu e aparentemente gostou do elogio. Porém, teve necessidade de revelar:
– Paguei tão baratinho…
Diacho. Mulher, quando recebe elogio, tem sempre que arrumar uma explicação. Como se não o merecesse e precisasse de uma justificativa para estar ou ser bonita. Como se procurasse algum detalhe que lhe diminuísse o valor. Ou então, o contrário. Uma tentativa de auto-valorização. Como se dissesse: “Meus cabelos são bonitos mesmo imundos”. “Meu vestido é antiquíssimo e eu fico linda nele.” “Eu uso sapatos baratos, mas veja como sou elegante.” Não sei o que é pior.
As pessoas elogiam por vários motivos. Para lisonjear. Por interesse. Porque têm a expectativa do agradecimento – querem atenção, então dão atenção. Para registrar uma opinião ou impressão. Ou porque acham a coisa bonita e sabem que a outra pessoa gostará de saber. Simples assim. É meu caso: não importava se o cabelo havia sido lavado naquele dia ou três dias atrás; se o vestido era novo ou se já andava sozinho; se os sapatos haviam custado os olhos da cara ou uma mixaria. Gostei. Ponto final. Coisa feia recusar elogio.
Repare: acontece quando o elogio é dirigido a uma mulher, onde ela própria é a elogiada. Se você elogiar o filho dela, ela concordará (e complementará). Em contrapartida, elogie um homem – sua gravata, por exemplo – e ele simplesmente responderá: Obrigado. Já viu homem explicando que a gravata era do camelô, que estava no fundo da gaveta, que comprou em Nova York? Tem certas horas em que a objetividade masculina é invejável.
Cena 4. Tirei o cartão da bolsa para pagar minhas compras. A moça do caixa usava um anel que era luxo só. Grudei os olhos nele, suspirei, ensaiei o elogio… E limitei-me a dizer:
– Débito, por favor.
Maybe…
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Ameiiiiii….e concordo com vc. Porque diabos não sabemos receber elogios?
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Adorei seu texto.Especialmente pq costumo reparar nas coisas positivas, e nao nos defeitos do outro.E tem coisa que todo mundo enxerga, comenta e eu não!rs
Lembro que uma vez uma colega comentou que tinha feito prótese ocular, eu não tinha reparado mesmo e comentei” nem parece que vc tem prótese”, ao que ela respondeu( brava)” Parece, sim!”, e saiu , ofendida. dando as costas p/ mim.Dá vontade de pensar 2 vezes antes de elogiar alguem. Para mim, daquele jeito, ela estava bonita,( com ou sem protese, aparente ou não)… beijos!!
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Depois de você ter elogiado minha foto e eu ficar justificando que mal sei tocar violão, tive que voltar aqui e ler seu texto pra ver se aprendo.
Beijo.
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Adorei seu texto, como sempre. Também adoro elogio: fazer e receber. E ainda espero pelo nosso cafezinho, antes que eu vá embora pra Sampa.
Beijoca
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Ah! Claro: este é só mais um dos seus textos que eu queria ter escrito. rs
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Certo dia, coloquei uma camiseta antiga, listrada de vermelho, azul e dourado, e fui pra aula. Três ou quatro pessoas conhecidas elogiaram. E ela é bonita mesmo! E muito antiga. Até que uma super amiga disse: _Que camiseta linda! E eu: _Nossa, ela é tão velhinha! Olha só a gola! Parece um 8!
Ela: _Rafa, você não sabe receber elogios! Ela pode ser velha, mas é bonita!
Justo eu, que sou de elogiar tudo em todos, conhecidos ou não. Era a lição que me faltava!
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Silmara, eu amei esse texto. Eu não aguento ficar calada se acho alguma coisa bonita. Igualzinho a Você. Quantas vezes já me arrependi, mas simplesmente não consigo gostar e calar, queiro que a pessoa saiba
pra ficar feliz. Tão simples isso.
Mas, tô aprendendo que as pessoas são complicadinhas!
Vc escreveu tão fielmente o que acontece comigo que somos gemeas em querer retribuir o agrado a quem nos agrada.
Felicidades e obrigada pela tradução.
beijos
V.
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He, he, he!
Dá trabalho elogiar. Dá trabalho, receber elogio.
Comprei o cd e DVD do último show da Fernanda Takai: “Luz Negra”. Ela estava maravilhosa: além de adorar ouvi-la cantar, ela é graciosa, o vestido do show parecia uma obra de origami, enfim, arrasou! Achei tão espontâneo da parte dela, quando, entre os aplausos após uma canção, uma voz masculina, berrou da plateia: “MA-RA-VI-LHO-SA!” Houve um silêncio, por alguns instantes, até ela falar ao microfone, abrindo um sorriso, naquela sua voz miúda: “obrigada”. Todos riram, inclusive, o marido dela, que estava no palco. Desarmou.
Esta é a minha Fernanda…
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Adorei, e muito, o final desta cronica, mas é verdade, a objetivdade de nós homens economiza e muito nossa vida social.
Abraços Ruminados
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Oi Silmara!
Nossa! Super claro seu texto. E sim! É estatístico. Elogiou, pronto. O outro se deprecia! Nem só justifica, se detona mesmo!
Já brinquei um monte com isso… Vou lá e falo que a roupa é bonita, será sempre velha(pode conferir, até as novas viram usadas!). Já concluí que as coisas velhas são as mais bonitas. Risos…
Que pena né? Ou que chance né que temos de quebrar esse padrão… Dá vontade (e já atendi a esse desejo) de dizer assim:
– Viu? É bonito assim mesmo, mesmo velhinho, mesmo sujinho… Viu? Vê se aprende a se gostar! Simples assim, sem explicar!
Beijo no coração,
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Quanta espontaneidade, Sil!
Acho que tenho que praticar mais os elogios.
Só os seus textos, que elogiar já virou até rotina 🙂
haha
beijo grande
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Olá querida!
Meu marido sempre fala isso: -Mulher não sabe receber elogio!
Mas ele, que é muito lisonjeiro, mata a mulherada de vergonha, pq ele ja vai falando na lata: – Vc pode simplesmente agradecer, não estou perguntando onde comprou nem qto pagou, vc não gosta de ser elogiada?
Bijim e Om Shanti
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Silmara,
Passar por aqui é sempre como ganhar um presente ou um abraço de uma amiga. Que delícia de texto!
Admiro sua facilidade com a escrita, e mais, sua delicadeza e sensibilidade de enxergar a vida com tamanha sabedoria. Olhar ímpar esse que você compartilha com cada um de nós! Obrigada!
Beijo grande em você.
Pri
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Sil querida,
concordo, concordo, concordo. Já havia pensado nisso: não sabemos mesmo receber um elogio. Por isto, eu faço um exercício cotidiano de dizer simplesmente, Obrigado. Sem qualquer justificativa.
Beijocas com cheirinho da Lê (ela esta cada dia mais linda e estou te devendo umas fotos atuais).
Ana
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Elogiar é sempre bem vindo.Agradecer o elogio é melhor ainda.
Com carinho Monica
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Sabe Silmara,
Me tornei um pouco mais receptiva a elogios depois que tive meu filho. Admito que de tanto receber elogios a ele, fiquei mais expressiva e elogio muito mais os filhos dos outros tambem. Comecaram a sair com naturalidade.
Hoje e uma coisa normal: gostei, falei! Sem interesse, sem curiosidades, sem querer saber de nada, so pra elogioar mesmo. Sou um pouco timida tambem.
Assim como aceito elogios com um simples: Ai brigada! Ou um Oh thanks.
Mas acho que a pessoa que elogia facilmente sem interesse algum e aquela que tem mais facilidade em ser receptiva ao elogio.
De qualquer forma, sei que ainda resisto de vez em quando. Vou comecar a praticar a reagir com nada mais do que gratidao.
Esse texto eu chamo de um “eye-opener” que e pra acordar mesmo pra vida.
Bjos.
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Adorei. Conheci seu blog atraves do hoje vou assim. Virei mais vezes, gostei muito.
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Ah, ia me esquecendo… Adorei o seu comentário na blog da Cris, sobre a polêmica da roupa. Poucas pessoas tem o talento de resumir em palavras o pensamento que está no inconsciente coletivo. Você, com uma mistura de bom-senso e poesia, consegue fazê-lo com maestria.
bj
Ivana
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Oi Silmara,
Saudade d’ocê.. Tenho passado rapidinho, lido rapidinho, sempre correndo. Mas estou sempre por aqui, vendo as novidades.
Sabe, eu também tenho a mania de recusar elogios ou subestimá-los. Há um tempo, tenho tentado mudar isso.
Mas com o Davim vc acertou. Aceito todos e de muito bom gosto. Às vezes, sou eu mesma que encabeço os elogios. Coisa de mãe coruja. Na verdade, ciosa de mãe.
bjs
Ivana
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Eu tenho um amigo que faz piada dizendo que, sempre que elogia a roupa de uma mulher, ela responde dizendo o quanto pagou (“menino, vc não acredita, uma liquidação óóótima!”). Eu morro de rir dessa graça, que uma amiga psicóloga desvendou: é como se as mulheres tivessem que ficar prestando conta do dinheiro que gastam o tempo inteiro.
Bom, psicologias à parte (ou nem tanto): super me identifiquei! Tanto porque adoro elogiar (tb tenho um radar para sapatos e acessórios bonitos, hehehe) quanto porque fico meio sem graça com os elogios que recebo. Estou treinando apenas sorrir e dizer “obrigada”. Não por medo da inveja alheia, mas porque, como vc bem disse, recusar elogio é muito feio.
A propósio: Sil, vc é ótima! Que faro para captar situações interessantes e que talento para transformá-las em textos!
Beijoca, Ana F.
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Silmara você escreve bem demais!
Descobri seu blog esses dias e estou devorando, aos poucos.
Abraços!
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Olha, Sil, não sei se acontece com vc, mas pra mim cada vez que uma mulher elogia alguma coisa minha é só para saber quanto paguei ou onde comprei, hahahaha!! Eu digo e repito, mulher é bicho esquisito…perigoso….mas enfim, a desconfiança nos rege nestes tempos confusos, então o melhor é mesmo dizer apenas obrigada e sair de fininho, esconjurando três vezes, por que inveja de mulher pega mais fácil que catapora. Deus me livre.
Beijos!
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Oi!
Ser elogiada é quase sempre um problema pra mim, me reconheci bastante nas três cenas… Eu sempre rebato, porque nunca sei o que dizer. Um “obrigada” basta, né? Mas às vezes sinto que o “obrigada” pode parecer meio presunçoso, tipo um “concordo plenamente, sou demais”. hahaha. Acho que tenho que trabalhar isso…
Adorei o texto sobre as cartas de amor tbm. Passar aqui e encontrar suas palavras é um bálsamo para o estresse de todos os dias.
Beijos.
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Oi Silmara!
Que saudade!
Não tenho comentado mas tenho vindo sempre aqui. Seu texto “Sobre cartas de amor” foi mais um daqueles que me fizeram pensar longamente. O de hoje foi maravilhoso, genial! Sua sensibilidade é algo assim inominável, incomparável! Gosto muito de você.
Beijos
Nara
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Hahahaha…
adorei Silmara… e acho que aprendi algo… hehehe não vou mais me explicar quando alguém elogiar algo em mim, ou nas coisinhas que faço…
pois sou bem assim…
Um beijinho
Josi
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Mas é a maior verdade que ja li, não sabemos receber elogio, sempre tem um “mas” ou um “porém”, eu mesma estou aprendendo a receber elogios sem pestanejar, agradeço, sorrio e retribuo com um enorme abraço, então diante disso:
Sil, você é linda, excelente escritora, adoro você.
Beijos lindeza
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Você está certíssima quanto aos homens. Mas acho que ainda existem mulheres que apreciam os elogios. Eu, por exemplo… hahahahaha
Amo meu cabelo, sei que é bonito, jeitoso, tem brilho próprio (“eu sou o sol…”) e quando qualquer pessoa elogia, eu agradeço com gosto. Mas sei também que sou a exceção. Talvez por ter trabalhado bastante a auto-estima. (“Eu me amo, eu me amo, não posso viver sem mim!”)
Adorei seu auto-controle (com hífen?) no caixa.
Ah, obrigada pelo feed!!!
Bjooooo
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Ah, nem sempre! Se houver uma boa história atrás da compra da gravata, prepare-se!! Suspire, pegue uma bebida, o cara vai se vangloriar e contar a história com a animação de Homero recitando a Ilíada.
Mas existem casos e casos…
Eu adorei o texto! Gostei muito do formato escolhido.
Abraços!
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