Betsy Jean/Flickr.com
Dobrou o papel e colocou-o dentro do caderno azul, já cheio de papéis. Apanhou o telefone na bolsa, fez que ligaria. Parou no meio. Repousou o telefone sobre a mesa. Olhou para ele como quem pedisse sua opinião: Ligo ou não? Mas o telefone móvel, agora imóvel, nem prestara atenção à pergunta.
Conferiu o lanche que acabara de chegar. Sim, todas as fatias de tomate estavam lá. O queijo, derretido à perfeição. Tudo certo, como sempre. Mas ainda faltava uma coisa. Olhou novamente para o telefone. Passou os dedos sobre ele: Ligamos? Desta vez o telefone deve ter sugerido: Melhor não. O que a fez suspirar longamente. O melhor a fazer, então, era devorar o lanche.
Que falta ela sentia de um bem, que falta lhe fazia um xodó. Mas não seria bom ligar, o telefone já a aconselhara. Chamou o garçom. Precisava beber alguma coisa.
O rapaz, elegante em seu uniforme novo, já a observava desde sua entrada. E viu ali sua primeira – talvez única – oportunidade de conversar com a moça. Vestiu seu melhor sorriso, voou em sua direção e pousou ao seu lado:
– Pois não?
– Uma água, por favor.
– Com ou sem gás?
– Com.
– Gelo e limão?
– Pode ser.
Ele, que não tinha ninguém e levava a vida assim, tão só. Se ao menos ela lhe notasse. Ela também não tinha ninguém, e tudo o que queria era um amor que acabasse o seu sofrer. Mas ela tinha o telefone. Que não a deixava ligar, talvez sabendo da desilusão por vir. Era um smartphone.
Trêmulo, ele lhe serviu a água. Buscou seu olhar. Ela ajeitava novamente os papéis no caderno azul. Para ela, ele era invisível. Ela só queria um xodó para si. Que fosse assim, do seu jeito.
Ela bebeu a água com o olhar perdido e tristonho. Pagou a conta, apanhou a bolsa e saiu. Mas esquecera algo sobre a mesa.
Enquanto ele recolhia sua louça, quase feliz só por tocar no copo em que ela tocara sua boca, não acreditou no que vira. A felicidade existia, então. Guardou o aparelho, esquecido, junto ao seu peito, e esperou a tarde inteira que ele tocasse. Afinal, ele também andava querendo alguém que alegrasse o seu viver.
Um conto bem interessante!
Com carinho Monica
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amei teu texto, amei teu blog, já adicionei nos favoritos para não perder nada dessas maravilhas que tu escreves! bj
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Menina, eu aaaaaaamo essa música !!!
Eu ainda era bem menina e já cantarolava isso por aí !!!
Por muitos e muitos anos foi “minha música tema”…
Agora eu tenho um xodó, na verdade tenho dois, marido e filho.
Não tenho nem mais tempo de pensar em solidão !!!
Continuo gostando da música, ela ainda me faz dançar, mas sem aquela “tristezinha” de antes.
Ainda bem. Melhor assim.
Lindo o texto, me fez lembrar de mim…
Beijos
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Passei correndo com a intenção de só ver se havia uma postagem nova. Fiquei, li, adorei! Pausa deliciosa no meu dia corrido. Beijos apressados da Sissi.
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Surtei, como a Flávia. É uma delícia aqui, Sil!
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desacreditei ao perceber a música fragmentada no post.
Simplesmente genial e suave, como o tudo que já li desse espaço aconchegante.
Boa semana, moça Silmara!
[tb ri do smartphone!]
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Que lindo!
Como disse Quintana:
“Quantas vezes a gente, em busca da ventura,
Procede tal e qual o avozinho infeliz:
Em vão, por toda parte, os óculos procura
Tendo-os na ponta do nariz!”
Beijo, Silmara!
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muito lindo. muito bom.
[como tudo por aqui, como tenho visto há alguns dias..]
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Menina,
estou pasma. Tenho uma crônica muito parecida com esta que foi publicada pelo meu colégio e que eu escrevi em 91. Vou procurar para te mandar. Impressionante.
Beijos
Ana
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Nossa Silmara, eu amei!! Achei ótima a simplicidade do conto e a forma como você brincou com a música. Ri na parte do smartphone e fiquei curiosa para saber o que tinha no tal caderno azul. Esses contos que deixam a gente pensando, na dúvida, são sempre os melhores.
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